“O conceito de teatralidade permite articular o teatral e o não teatral, na medida em que pode dar conta de um desejo de teatro no que ainda não o é e que ilumina a relação entre texto e representação, esta sendo definida como a assunção de um texto pelo corpo e pelo espaço cénico ”.Geneviève Jolly e Muriel Plana, “Théâtralité”, in J.-P. Sarrazac (ed.), Lexique du drame contemporain. Paris: Circé, 2010, p.213
No
conto “Coisa-ruim”, de Tchékhov, encontramos vários elementos impressivos e
indícios de teatralidade, seja através da noite, do incêndio que ocorre no
final, ou no momento em que o guarda acende os fósforos. Assim, podemos dizer
que há um desejo de encenação, como Sarrazac define no supracitado conceito de
teatralidade.
Os elementos teatrais, como por exemplo, o
guarda-roupa, o som e os gestos das personagens, de um modo individual,
transmitem-nos mensagens e sensações diferentes, tal como no conto em apreço.
Deste modo, a teatralidade define-se em relação ao palco, ao espetáculo.
Tchékhov retrata o ser humano tal como ele
é, sem erros, mas também com defeitos. Trata-se de uma narrativa que se pode
caracterizar como realista, convencional e dramática, através de diálogos,
pelos quais se vai descobrindo a história. É concluída em modo aberto.
Em “Coisa-ruim”, que se inicia com uma
longa citação, que pode corresponder a uma didascália, o tema da morte faz com
que o medo se desenvolva ao longo da história (p.e. “Fecha os olhos, cheio de
medo, todo o corpo lhe treme, aperta-se contra a cerca. (...) Com um mau
pressentimento e ainda a tremer, o aguarda abre a cancela (...)”.
Um tom sombrio - não fosse Tchékhov um
autor da desesperança - é evidente através do cenário descritivo, ao
desenvolver-se à noite regista-se um nível de tristeza simplesmente pela hora
do dia, bem como pelo local - um cemitério – que traz à tona sentimentos de
tristeza, utilizado pelo autor – como a aludida espessura das significações e
dos sentidos - para que o leitor se sinta assustado e vulnerável ao
desconhecido, com base na configuração sombria. Ainda, em contraste ao tom
sombrio, à escuridão, que simboliza o desconhecimento, os momentos de claridade
representam o conhecimento.
Em suma, no conto teatral “Coisa-ruim”, ao
domínio da tensão psicológica em detrimento da ação, temos presente
características tradicionalmente teatrais, como um abundante discurso direto, no
presente do indicativo, sendo essencialmente construído através das falas das
personagens, criando assim uma ideia de temporalidade.
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